quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Bolinho de Chuva com Maçã





Notem na imagem que segue, o bolinho por dentro e perceba os pedaços pequenos de maçã derretidos, também a fofura e umidade da massa. É o poder da delícia!

 

Bolinho de chuva é um regalo que as mães, principalmente as avós, faziam para os pequenos da família. Era só começar a trovejar, a pingar e uma delas já aparecia na janela ou no portão para chamar os filhos ou os netos para dentro da casa. E para acalmar as crianças daquele tempo, sempre acostumadas a brincar na rua sem nenhum perigo, então mães e avós faziam uma bela travessa de bolinhos de chuva, que eram devorados com goles de leite com achocolatado,

Era um tempo que os portões das casas eram baixos e não precisavam de tranca. Os brinquedos duravam uma vida toda, muitos eram consertados e passavam para os irmãos ou primos mais novos. Os pés viviam descalços, os joelhos e cotovelos ralados, os brinquedos não tinham nenhuma regra de segurança controlada, a bicicleta dormia no quintal, as bonecas dormiam sentadas nos muros por muitas noites e nunca desapareciam, a comida era muito simples e totalmente caseira, a fruta era uma bela banana que a gente descascava e molhava a ponta em uma pequena xícara cheia de leite ninho em pó misturado com açúcar e, assim, a banana era devorada até terminar. A banana com o leite ninho na boca, virava um grude que a gente adorava, era um manjar. Não podíamos perder tempo indo ao banheiro ou bebendo água. Essas coisas atrapalhavam toda a brincadeira. O filho do vizinho tinha uma rã que soltava na rua e fazia a gente correr e gritar de susto quando ela pulava. Meu pai trabalhava dirigindo um caminhão imenso, que dormia estacionado na rua, e ele deixava a gente ficar na boléia, brincando de dirigir. Um primo deitava na rua bem esticadinho, achando que quando o carro passasse, nada aconteceria com ele, completamente intacto no vão entre a rua e o carro e todos nós sentávamos na calçada esperando por um carro para assistir o primo debaixo do carro, até que alguma vizinha saísse correndo na maior gritaria acabando com a perigosa brincadeira.

Riscávamos a calçada com giz para pular amarelinha, pulávamos corda, andávamos de carrinho rolimã na carona de um primo mais velho e as cinco horas da tarde, lá estava a mãe ou a avó chamando novamente, dessa vez para tomar banho, o momento diário mais chato que roubava os mais preciosos prazeres da vida de uma criança rsrsrs.

As crianças, as mães e as avós eram livres e felizes, pois nada era muito perigoso, violento ou suspeito. Os carros eram poucos, para passarem pelas ruas e atrapalhar a brincadeira ou oferecer perigo. E sempre tinha um adulto que defendia as crianças da rua e ficava mais atento com o movimento e, se precisasse, corria para salvar as crianças das artes e depois dos pais.

Na foto abaixo, passeando no sítio do tio Felipe, em Vinhedo, interior de São Paulo, eu de maria-chiquinha com minha madrinha Cacilda e minha prima Luciana. A madrinha era muito preocupada com as crianças na rua, sempre defendia todos os pequenos.


Na foto abaixo, eu com minha madrinha Cacilda em 2007.


Na foto que segue, eu sou a garotinha de tiara, com minha irmã mais velha ao meu lado, Maria Luiza. A bebê é minha prima Luciana e a prima Lucianita, logo atrás, a mais velha das netas da nonna materna Seraphinna.


Eram tempos maravilhosos, com um modo de vida descomplicado. O que eu mais sinto falta? Das histórias que eram contadas, pelos mais velhos, para toda a família. As minhas duas nonnas eram dois livros recheados de histórias, era fantástico! 

Da nonna paterna, Ermínia, eu ouvia histórias da distante família que ficou na Itália, da saudade da mãe Teresa Castello, e de um certo "Il Duce", também conhecido como Benito Mussolini, da viagem de navio, das tempestades em alto mar, da gravidez do meu pai enfrentada no porão do navio e do comandante que sensibilizado, colocou-a em uma acomodação mais apropriada para uma gestante em constantes enjoos. As falas eram cheias de ódio, quando a história era sobre o tirano Mussolini, posso lembrar perfeitamente, ela até ficava mais rosada. Da minha nonna materna, Seraphinna, eu ouvia histórias do cotidiano difícil dos pais e dos nove irmãos, ela também adorava acender um cigarro e contar fábulas, além de cantar canções italianas em dialeto que aprendeu com os pais. Outra coisa que a nonna Seraphinna gostava de fazer, era discursar em celebrações familiares, incluindo casamento, nascimento e funeral. 

As histórias sobre os antepassados da família ou mesmo as fábulas, eram esperadas nestes dias chuvosos, acompanhadas obviamente dos bolinhos de chuva. Todos ficavam em silêncio, sentados perto da nonna. Eu gostava de sentar no chão, encostada nas pernas dela. Ela sempre pegava uma mecha do meu cabelo e ficava enrolando com os dedos, era um cafuné dos deuses!  

1 e 1/2 xícaras de farinha de trigo
1/2 xícara de açúcar
1/2 xícara de leite ou um pouco mais
1 ovo grande
1 colher de sopa de azeite de oliva
1 maçã descascada e cortada em cubos bem pequenos
1 pitada de sal
1 colher de chá de fermento para bolo
1 colher de sopa de cognac ou um pouco menos de anisete ou cachaça de boa qualidade - aqui está o segredinho, o álcool: deixa o bolinho sequinho, muito macio e perfumado! Com anisete o aroma é simplesmente mágico!

óleo de semente de girassol ou azeite de oliva para fritar

açúcar com especiarias em um prato fundo - clique aqui para ver a receita


Quebre o ovo em uma vasilha, junte a bebida e bata até espumar com um fouet. Depois entre com o açúcar e bata até misturar bem, quase não sentindo mais os grãozinhos de açúcar raspando no fundo da vasilha.

Junte o azeite e o leite, misture bem. Junte a farinha de trigo com o sal e bata bem. Se a massa estiver muito grossa, junte mais leite, mas um pouquinho de cada vez, pois a consistência desta massa é mais para densa, não deve ser uma massa muito líquida.

Deixe descansando por meia hora se puder para umedecer bem o amido, o que vai garantir uma leveza na massa que derrete na boca! Não junte a maçã e o fermento. Só junte depois do tempo de descanso.

Se não tiver este tempo, siga com a receita juntado a maçã picada, misturando e depois o fermento e incorporando tudo energicamente e não por muito tempo.

Leve uma panelinha ao fogo com o óleo ou azeite até 1/3 da panela. Espere aquecer, na temperatura nem muito quente e nem muito fria. Deite colheradas da massa e frite, virando para que doure dos dois lados. Frite poucos de cada vez para não esfriar o óleo.

Retire e deixe escorrer em papel absorvente, em seguida passe os bolinhos ainda quentes no açúcar com especiarias e arrume em um prato de servir.

Atenção, pois quando o óleo estiver bem quente, lá pela segunda ou terceira leva de bolinhos, abaixe mais um pouco o fogo, pois os bolinhos fritam e escurecem super rápidos.

Quando criança, eu gostava de bolinho de chuva com leite e achocolatado, mas agora eu gosto com café amargo. É isso mesmo, só tomo café amargo, ai que delícia! Li outro dia que foi feita uma pesquisa na Áustria, em uma universidade, onde verificaram que o gosto por sabores amargos pode revelar uma pessoa psicopata ... já pensaram? E os que gostam de sabores mais doces e não suportam os amargos, são mais simpáticos e bonzinhos. Ai de mim ... ai de mim! Míseros restos! rsrsrs

Ciao!




14 comentários:

  1. ADOREI teu post. A receita, as fotos, as tuas recordações tão lindas! Muito legal! bjs, chica

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    1. Oi Chica, beijo querida, obrigado pela presença amore. Um ótimo final de semana. Beijo s2

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  2. Bolinho de chuva é muito bom, também adoro chiacchiere. é tão bom recordar, receitas e lembranças.. essas também marcaram a minha infância. Beijos

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    1. Keyla, eu conheço o chiacchiere, adoro também, mas com a massa bem fina. Temos uma receita de família parecida com o chiacchiere, que na Itália é chamada de cartellate. Quantas lembranças agora!
      Um beijo minha querida amiga e obrigado pela sua presença s2

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  3. Branca, você é uma pessoa incrível!
    Sempre q puder, vou passar por aqui, pois viajo nas suas histórias e levo a receita para experimentar. Muito obrigada e sucesso sempre! Bjs.

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    1. Deise! Um prazer ter você aqui! Obrigado pelas palavras, pela confiança e desejo muitas felicidades para você a sua família, um beijo querida s2

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    2. O prazer é todo meu, ter uma amiga como você! Hoje estou preparada para fazer esses bolinhos deliciosos! Depois eu conto! Bjs.

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    3. Ai ai Deise, quero ver como ficou! Tira uma foto? Beijinhos s2

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  4. Amei seu post, Gloria!...
    Outros tempos, outros valores, outras gerações... tão diferentes da realidade actual...
    E não acredito que estas novas gerações, que vivem tendo a ultima moda de brinquedos sofisticados, sejam realmente mais felizes, do que quem sabia valorizar o pouco que tinha, ou que partilhava com outros, ou brincava na rua sem receios de qualquer espécie... apenas estamos criando uma geração indiferente e apática... agarrada a um virtualismo, que não lhes transmite qualquer preparação em termos de relações humanas, e afectos...
    Debita-se toneladas de informação, com as novas tecnologias... mas não valores... nem apreço pelas coisas e pessoas...
    Adorei a receita! Um beijo imenso! Boa semana!
    Ana

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    1. Ana, eu concordo plenamente com as tuas palavras: indiferença, apatia e ausência de valores. É assim mesmo, preocupante!
      Um beijo querida.

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  5. Me vi um pouco na sua infância. Não chegava a brincar na rua porque sempre moramos em avenida, mas a alegria era ir para a casa da vó, que além de ter um bom pedaço de terra e árvores, tinha uma rua de terra que raramente passava algum carro.
    O bolinho de chuva também era molhado no leite ou no chá mate. E os dias de chuva já eram de expectativa rsrs. A mãe, às vezes, fazia com banana na massa... ô delícia!!!
    Também tomo café amargo e não tenho costume de adoçar chás, sucos e leite... pobre de mim que ama o amargo rsrs.
    É bom te ler... viajo para uma época saudosa... tempos que não voltam e que a simplicidade alegrava nosso coração.

    Abraços esmagadores no Dia do Abraço e feliz semana.

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  6. aiaiai, rsss que postagem sensacional!!Quantas recordações lindas, sim, os muros eram baixos, tinham portões sem tranca, sem cadeado, a gente sentava no muro e conversava com os vizinhos que passavam. Os brinquedos ficavam no quintal. E os bolinhos de chuva? Pedro até hoje fala nos bolinhos que sua mãe fazia, é louco por bolinhos de chuva. Tempos que não voltam. nem sonhávamos com computadores... Meus filhos, tadinhos, criados em apartamento, Kombi escolar levavam e traziam do colégio. Eu ia e voltava sozinha. Perigo zero. Mas hoje já adultos. Divertimento sabes qual é...rsss Mundos diferentes.
    Beleza de crônica, amiga!
    Beijo grande, descobrindo coisas por aqui...

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  7. Maria Glória, prezada amiga de São Paulo, essa cidade que não para.
    Vamos por partes. Bolinhos-de-chuva são excelentes e remetem-me há quase setenta anos quando mamãe os fazia e tudo virava uma brincadeira e ela mui esperta fritava-os em banha bem quente, pois assim dourava por fora, porém seu interior ficava verdadeiramente cru, o que fazia a alegria, principalmente a minha. Adorava quando vinham derretidos por dentro. Hoje é Monica, nossa filha, quando vem aqui em casa os faz e tem o cuidado de deixar com o interior derretido e cobertos de açúcar e canela.
    Outra coisa que mamãe fazia eram as rodas-de-carreta, farinha de trigo, sal, um pouco de gordura, água e ligeiramente sovada, aberta com um pau-de-macarrão, cortadas em pedaços e fritas. Muitas vezes ela usava um pires para cortar com uma boa faca as rodas iguais. Donde vem o nome roda-de-carreta, Ainda hoje faço, quando em vez e gosto de enrolá-las depois de fritas, com mel, ou coisa estranha, enrolá-las com mel e folhas cruas de espinafre.
    Lembrei-me dos bolinhos de arroz, que Sandrinha faz seguidamente. Aqueles que sobram do almoço eu os como no café da tarde, porém recheados de doce de leite.
    Linda esta história que contas de um tempo de paz, pés descalços, portões abertos.
    Adorava quando mamãe assava peras no velho fogão à lenha, pois tudo para as crianças são magias fascinantes.
    Em frente a nossa casa estendia-se um campo sem fim (para nós crianças), havia vacas e cavalos, mas quando em vez papai nos deixava ir campo a fora até uma renque de eucaliptos, que do outro lado se estendia o fleumático Parque Souza Soares, lugar que os ricos iam passear em suas cabrielets, faytons, traquitanas, atreladas a belíssimo cavalos ou as novíssimas fubicas, como os Ford de Bigode, há uns duzentos metros de nossa casa. Mamãe preocupada dizia: Cuidado por onde pisarem, pois tem cobras. Realmente, cruzeiras, jararacas e parelheiras costumavam aparecer. Mas nós, “nem te ligo” para cobras. Queríamos a aventura. Porém ao ouvir o assovio de papai, tudo cessava e voltávamos correndo para casa.
    Gostei de ver as fotos, a menininha de tiara, da vovó Hermínia com as netas, as canções e histórias da vovó Seraphina.
    Papai quando fazia pães e massas sempre usava a “marvada”, pois a cachaça torna a massa sequinha e perfumada, e enquanto preparava, ia bebericando um pouquinho. Delícia.
    Quanta coisa linda e apetitosa em teu espaço. Fiquei fã e certamente alguma coisa irei fazer.
    Abraços caríssima. Bom domingo.

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